Cada vez mais nos é pedido que esqueçamos a vida pessoal para abraçar indústrias que nos exigem um foco e dedicação quase totais. É compreensível que para fazer crescer um negócio temos de investir dois recursos limitados: tempo e esforço. A atual crise nos caminhos de ferro, na educação, na saúde faz-nos ver que há brechas nesta forma de pensar, quando não levamos em conta o bem-estar dos outros.
Como pode um enfermeiro ou médico cuidar do doente se não consegue ter tempo para cuidar de si próprio. É certo que a união ainda faz a força, os sindicatos reúnem-se para reclamar melhores condições de trabalho e que as respetivas profissões sejam valorizadas mas a sensação é que seguimos a passo numa valsa que não sabemos onde vai dar.
Abrimos a televisão que não deixa de nos despejar notícias sobre crimes, acidentes, desaparecimentos e a guerra na Ucrânia e no Médio Oriente. Como manter o ânimo quando tudo parece em estado de sítio, completamente caótico. Há um ditado que diz se pensarmos em mudar o mundo, para darmos três voltas na nossa própria casa. Hoje em dia, com os meios de comunicação social e as redes sociais omnipresentes fica aquela sensação angustiante de que se calhar podemos fazer mais.
Voltamos ao título desta entrada. Não somos máquinas, que podem reagir a qualquer programação e não têm a obrigação de filtrar a informação que recebem, que são construídos com os materiais que os seres humanos decidem. Casos de stress extremo, ansiedade generalizada e burnout mostra-nos que trabalhar demais tem os seus efeitos a longo prazo no nosso organismo e que há limites traçados pelo nosso corpo que devemos respeitar. Quando não beneficiamos do sono e repouso, de atividades de lazer adequadas aos nossos interesses, vão-se formando buracos dentro de nós e queremos uma mudança. É aí que entram as manifestações contra o sistema. Não somos máquinas que não pestanejam, não choram, não sentem frustração. Então porque nos tratam tantas vezes como tal?
Paula Gouveia
Foto de Owen Beard na Unsplash